Bento XVI e Sarkozy

No jornal O Lutador

A “laicidade positiva”: um caso de enamoramento


Mais de uma vez tratei nessa coluna do tema da liberdade e da laicidade. Temas de importância profunda para as relações humanas e para a organização dos estados de direito, são assuntos que trazem em si carga imperativa sempre atual. É no âmbito da Igreja e suas relações que novamente ressoa o sinal. A viagem de Bento XVI à França foi marcada indelevelmente com o sinal da discussão sobre a laicidade. Mesmo antes de Ratzinger pisar pela primeira vez no país como papa muito já se falava sobre a questão das relações da Igreja e Estado, especialmente no caso o francês, nesse nosso tempo que alguns já denominam de “pós-secular”.

O presidente da França, Nicholas Sarkozy, já dava sinais, desde que foi eleito, que vinham em encontro ao pensamento do papa. Entretanto, o momento central e que já entrou para a história do século XXI foi o discurso de Sarkozy em 20 de dezembro de 2007, quando, na Basílica de São João de Latrão, demonstrou o que pensa sobre as relações da religião e o Estado. A principal noção defendida por Sarkozy é a de “laicidade positiva”, uma noção que, em primeiro lugar, se calca na idéia de que para haver uma, poderíamos dizer, “boa” e “fecunda” laicidade, não é necessário, ao contrário, imprudente seria, desejar eliminar as raízes cristãs que constituíram a história daquele país. Assim, ao contrário de análises superficiais que se multiplicam indiscriminadamente, Sarkozy não visa religar novamente o Estado francês à religião católica. O presidente afirmou que “ninguém contesta que o regime francês da laicidade é hoje uma garantia de liberdade: liberdade de crer ou de não crer, liberdade de praticar uma religião e liberdade de mudar, liberdade de não ser ferido em sua consciência por práticas ostensivas, liberdade para os pais de dar aos filhos uma educação conforme suas crenças, liberdade de não ser discriminado pela administração em função de sua crença”. Além disso, afirmou que “a laicidade não deveria ser a negação do passado. Não tem o poder de tirar a França de suas raízes cristãs. Tentou fazê-lo. Não deveria.” E concluiu: “como Bento XVI, considero que uma nação que ignora a herança ética, espiritual, religiosa de sua história comete um crime contra a sua cultura, contra o conjunto de sua história, de patrimônio, de arte e de tradições populares que impregna a tão profunda maneira de viver e pensar. Arrancar a raiz é perder o sentido, é debilitar o fundamento da identidade nacional, e secar ainda mais as relações sociais que tanta necessidade têm de símbolos de memória. Por este motivo, temos de ter juntos os dois extremos da corrente: assumir as raízes cristãs da França, valorizá-las, defendendo a laicidade finalmente amadurecida. Este é o passo que eu quis dar nesta tarde em São João de Latrão.”

De fato, a laicidade francesa nasceu de uma revolta anteriormente perpetrada contra qualquer símbolo que pudesse lembrar o período do Antigo Regime, assinalado pela forte presença da Igreja e sua ligação quase carnal com o Estado francês, chamado então de galicanismo. A Revolução Francesa de 1789 teve como um de seus objetivos eliminar totalmente a presença da Igreja Católica em seu território, e a partir de um novo culto ao Ser Supremo e a Razão extinguir de uma vez para sempre a presença de Deus na sociedade, o que os antigos estóicos chamariam de apostrophe, ou seja, a renúncia ao plano transcendental e divino. Tal ânsia descristianizadora foi uma constante no país e, para muitos, inclusive Sarkozy, deixou as portas abertas para a entrada de outras religiões estranhas à história cultural francesa, principalmente o islamismo. Alguns estudiosos especulam que o presidente francês e o papa Bento XVI são partidários da famosa teoria do “choque das civilizações” de Samuel Huntington. Tal teoria defende que a fonte principal de conflitos no novo milênio será cultural, e não mais econômica ou ideológica. Dessa forma, uma das principais maneiras de se proteger é valorizando a própria história e as raízes culturais de seu país.

Ao discursar no Palácio do Eliseu no último dia 12 em decorrência da presença do papa na França, Sarkozy repetiu novamente sua tese e defendeu veementemente à laicidade positiva. Bento XVI, por seu turno, olhava-o e ouvia-o atentamente. Ao afirmar que o pensamento cristão não fala somente de Deus, mas também do homem, notava-se em Bento XVI uma respiração ofegante e em seu rosto um júbilo profundo, quase esboçando um sorriso. Era um segundo momento de enamoramento entre Bento XVI e Nicholas Sarkozy.

Guardini e o homem


Será publicado na Itália em janeiro de 2009, sob a organização de Massimo Borghesi e Carlo Brentari o famoso livro L'uomo. Fondamenti di un'antropologia cristiana (Editora Morcelliana), de Romano Guardini. Atualmente ando pensando que a Antropologia filosófica é fundamental e de importância central para o debate atual. Quem sabe uma editora brasileira toma o projeto de uma tradução dessa obra?

Pio XII e os judeus

Sobre as relações entre Pio XII e os judeus na Segunda Grande Guerra. Do Comitatio Pacelli:

“ Il Congresso dei delegati delle Comunità Israelitiche Italiane, tenutosi in Roma per la prima volta dopo la Liberazione, sente imperioso il dovere di rivolgere reverente omaggio alla Santità Vostra ( Pio XII ), ed esprimere il più profondo senso di gratitudine che anima gli ebrei tutti, per le prove di umana fratellanza loro fornite dalla Chiesa durante gli anni delle persecuzioni... Gli ebrei ricorderanno perpetuamente quanto, nel tremendo periodo trascorso, per disposizione dei Pontefici, la Chiesa ha fatto per loro” ( Mozione approvata nel III Congresso delle Comunità Israelitiche Italiane tenutosi a Roma nel 1946 )

Debate sobre a crise do marxismo

Não é de hoje que se fala sobre a crise do marxismo. De fato, mesmo antes da queda do muro de Berlim, que foi o marco dessa crise, algumas vozes já se faziam ouvir sobre ela. Bem, em São Paulo acontecerá no dia 2 de outubro próximo uma palestra sobre a dita crise com o italiano Massimo Borghesi da Universidade de Perugia. O debate será na Rua Maestro Cardim, 370, no bairro da Bela Vista, próximo do Metrô São Joaquim (das 19h30 às 22h).

Editores católicos e tentação mundana

Em vista da republicação da Instrução acerca de alguns aspectos do uso dos instrumentos de comunicação social na promoção da doutrina da fé, pela Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, Nicola Bux "puxa a orelha" dos editores católicos em texto no L'Osservatore Romano. Abaixo segue trecho:

"La Congregazione per la Dottrina della Fede, ripubblicando l'Istruzione circa alcuni aspetti dell'uso degli strumenti di comunicazione sociale nella promozione della dottrina della fede, in sostanza vuole ricordare che una fede che non si sa difendere non si può diffondere, e così per la morale cristiana. Un esempio: non si può continuare ad affermare e a scrivere da parte di esegeti e teologi cattolici che la Risurrezione non sia un fatto storico, che il sepolcro vuoto sarebbe una "leggenda eziologica", mentre sarebbe storica la fede nel Risorto dei discepoli."

Nova Instrução sobre educação

No dia 25 de setembro, quinta-feira, será apresentada aos jornalistas a Istruzione sugli Istituti Superiori di Scienze Religiose, organizado pela Congregação para a Educação Católica.

Bento XVI e o avanço da razão

Artigo do vaticanista Sandro Magister, na revista do Instituto Aspen, aponta os impactos políticos de três anos de pontificado de Bento XVI. Indo contra a previsão de que Ratzinger não teria a influência que teve João Paulo II, Magister nos diz que o pontificado de Bento XVI faz política, mas de forma original: "Se Giovanni Paolo II era stato il papa delle folgoranti intuizioni, Benedetto XVI è il papa del ragionare e dell’agire metodico. Il primo era anzitutto immagine, il secondo è principalmente "logos"."

Artigo de Nicholas Bonnal nos fala "De la superioritè intellectualle de Benôit XVI"

Congresso Anti-islamização causa polêmica

Em Colônia, na Alemanha, realizar-se-á um Congresso Anti-islamização em vista da construção de uma grande mesquita na cidade. Nele estará presente a extrema-direita européia, além do anúncio de muitos manifestantes contrários ao evento, o que pode causar tumultos. Confira a notícia aqui.

Pio XII restabelecido


Não é de hoje que a questão "Pio XII e judeus" assume várias tonalidades. A maior delas é a de que Pio XII não tomou posição alguma em referência ao massacre que se avizinhava na Alemanha de Hitler. Entretanto, vários historiadores sérios já apontaram em outra direção, sem cair na furor anti-católico capaz de vender muitos livros. Hoje, Bento XVI defende seu predecessor em discurso por ocasião do congresso organizado pelo Pave the way, presedida pelo judeu americano Gary Krupp. Foi a ele que o papa dirigiu essas palavras.

Fala o "peregrino do absoluto"

"De que progresso nos falam eles, esses esperantes às avessas, escavadores do nada?"
Léon Bloy (1846-1917), o autodenominado "peregrino do absoluto"
Aqui, umas poucas palavras do grande escritor

Quaerere Deum


Ao comentar sua viagem a França, Bento XVI, no L'Osservatore Romano de amanhã, faz afirmações importantes e belas sobre o que chama de "autêntica laicidade":
"Autêntica laicidade não é prescindir da dimensão espiritual, mas reconhecer que propriamente ela, radicalmente, é a garantia da nossa liberdade e da autonomia da realidade terrestre".
Comentando sobre a importância da vida monástica no momento de crise do Império Romano diz: "quaerere Deum - buscar Deus, ser em caminho em direção a Deus, resta hoje como ontem a via mestra e o fundamento de toda verdadeira cultura".
Aqui, no final da página, um artigo do Patriarca de Veneza, Angelo Scola, sobre os 150 anos de ordenação sacerdotal de Pio X.

Site sobre Giuseppe Siri


Descobri um site do famoso cardeal de Gênova, Giuseppe Siri, aquele que quase por duas vezes foi levado ao trono de Pedro e que esteve bastante próximo de Lefebvre, Mayer e Sigaud compando a minoria conciliar no Vaticano II. Vale a pena dar uma olhada. Quem quiser saber mais sobre sua história e atuação no concílio confira o livro de Nicla Buonasorte. Siri: tradizione e novecento. Bologna: Il Mulino, 2006. Ah! Tem também a famosa obra de Benny Lai. Il papa non eletto: Giuseppe Siri Cardinale di Santa Romana Chiesa. Roma-Brai: Laterza, 1993.

Hoyos fala sobre Summorum Pontificum

No dia em que se inicia em Roma um congresso sobre o moto proprio Summorum Pontificum, o cardeal Dario Castrillón Hoyos, presidente da Pontifícia Comissão Dei Ecclesia dá uma entrevista a Bruno Volpe. Em italiano aqui, e em espanhol aqui.

Bach, Ah, Bach...

Johann Sebastian Bach
Cello Suite N° 1 i-Prelude

Bispos dificultam implementação de moto proprio

De acordo com o Secretário da Comissão Ecclesia Dei, aquela que cuida da questão de Lefebvre e seus seguidores, monsenhor Camille Perl, muitos bispos estão dificultando a implementação em suas dioceses e arquidioceses do moto proprio Summorum Pontificum. Segundo, Perl, muitos estão recorrendo diretamente ao Vaticano para a fim de usufruir do rito de 1962. Matéria completa aqui.

Religião e laicidade - Sarkozy

Discours de Benoît XVI à l'Elyséé

150 anos das aparições em Lourdes

...enquanto isso, nos nossos quintais repetem-se as mesmas questões e discursos recheados de populismo "anti-yankee" e falam , até mesmo, em "guerra fria sulamericana". Que será que nos espera?

Em França: Últimas palavras de Bento XVI sobre o Summorum pontificum


Andrea Tornielli em seu blog acompanha passo a passo Bento XVI em sua visita pela França. Ratzinger abordou o documento Summorum pontificum, em entrevista do avião que o levava em direção a Paris, pela primeira vez depois de sua publicação. Respondendo aqueles que pensam que é um passo atrás na história da Igreja o papa respondeu:

"É um temos absolutamente infundado. O moto proprio é sobretudo um ato de tolerância e de amor pastoral pelas pessoas que foram formadas nessa liturgia e a amam, a conhecem e desejam viver com esta liturgia. É um pequeno grupo, porque pressupões uma formação no latim e uma certa cultura. mas da parte dos bispos e da nossa Igreja parece uma exigência normal ser tolerante em relação a estas pessoas. Não é nenhuma oposição entra a liturgia renovado do Vaticano Ii e esta liturgia. os padres conciliares todos os dias celebraram com o rito antigo e ao mesmo tempo conceberam uma liturgia que tinha se desenvolvido. São acentos diversos, mas uma identidade comum que exclui uma oposição. penso que seja uma posssibilidade de enriquecimento entre as duas partes: os amigos da antiga liturgia devem conhecer os salmos e os prefácios da nova, enquento a liturgia nova, que sublinha muito a participação comunitária, não seja considerada só uma assembléia de uma certa comunidade, mas sempre um ato universal. A liturgia renovada é a liturgia ordinária"

Blog sobre a espera do papa em Lourdes.

"A Igreja da França em vias de extinção?" Aqui alguns sociólogos discutem a questão.

Para Yves Thréard, em seu blog no Le Figaro, o debate em torno da laicidade é interessante, contudo não prioritário e muito menos necessário. Para Thréard a França tem raízes cristãs sim e deve assumí-las. Contudo, ela não é incompatível com um humanismo sem referência divina. Ok, mas cá pra nós, humanismo sem Deus é manco, pois dilacera o indivíduo de sua constituição mais íntima: a busca do Todo. Não que sou a favor de uma Igreja ligada ao Estado, mas até que ponto o Estado democrático deve também virar as costas a uma tradição milenar, que foi a base de sua própria constituição?

Liberdade religiosa e cristianismo


Liberdade religiosa: exigência cristã

A liberdade sempre foi um tema forte no pensamento da Igreja. Em seus primórdios, o cristianismo fora perseguido devido as suas exigências de liberdade de consciência frente à imposição das formas diversas de paganismo pelo Império Romano. O cristianismo, com seu “daí a Cesar o que é de César”, abalava as estruturas culturais e políticas romanas e abria espaço para a dita laicização da esfera pública.

A certidão de cidadania no Império incluía obrigatoriamente uma dimensão religiosa. “Ser cidadão”, e assim usufruir do direito romano, abrangia forçosamente um aspecto religioso, que compelia o indivíduo às práticas pagãs, que por sua vez, serviam como amálgama ao grande império que já demonstrava sinais de declínio. Em vistas desses sinais, e de uma política de perseguição que não produzia os resultados desejados, mas ao contrário, fazia mais pessoas se converterem ao cristianismo, Constantino no início do século IV, com o famoso Edito de Milão, declarava que os cristãos, a partir de então, poderiam professar sua fé, tendo assim igualdade de direitos com as outras religiões. Era assegurada a liberdade religiosa. Com vistas em assegurar a permanência histórica do Império, alguns imperadores passam a ver no cristianismo a sua principal e última cartada. Começam a cercear sempre mais os cultos pagãos, chegando mesmo à sua proibição pública por Teodósio em 391. A situação se invertia. As intervenções imperiais na Igreja vão sendo sempre maiores. Nota-se, como exemplo, que o primeiro concílio ecumênico da história do cristianismo foi convocado pelo próprio Constantino em 325 em vista da heresia ariana. O chefe do Estado assumia as funções de regulação doutrinal, o que chamamos de cesaropapismo. Era o início de relações cada vez mais confusas e sobrepostas entre o poder temporal e o poder espiritual.

A dinâmica histórica ocidental, tanto na Europa quanto na América Latina colonial, de vários séculos seria marcada por essas relações, chegando mesmo, em alguns momentos, a Igreja ser simplesmente um braço espiritual de um poder secular, tendo seus bispos nomeados pelo poder político e até mesmo escolhendo este ou aquele como papa. Pertencer à comunidade de fé cristã era garantir seu reconhecimento também como pertencente da comunidade política. Era ter sua garantia existencial, na qual transcendia os espaços terrenos em vista do Reino futuro. Dessa forma, questionar as verdades da fé era grave delito que poderia levar a desestabilização da própria ordem política, calcada sob a égide da fé.

Contudo, as circunstâncias que levam a essa conjuntura passam a sofrer seus maiores abalos no século XVIII e XIX. A Igreja, questionada em seus dogmas a partir da ciência iluminista e nas suas relações com o poder temporal pelos valores revolucionários franceses de 1789 que buscavam o constitucionalismo liberal, passa a ser o alvo principal de ataque. Muitos a vêem como a principal representante que sobrevive daquele mundo demarcado em estamentos rígidos e cheios de privilégios chamado pelos historiadores de Antigo Regime.

Abalada pelas exigências de liberdade e questionada em sua autoridade máxima, o papado, a Igreja do século XIX opta por uma estratégia de recusa e enclausuramento. A defesa, pelo pensamento político liberal, de uma laicidade, isto é, separação do Estado da religião, confundia-se com um laicismo agressivo, que negava qualquer voz provinda dos círculos religiosos, especialmente na Europa Ocidental. Frente aos ataques que partiam de todos os lados, a Igreja recua ainda mais e, como “fortaleza sitiada”, deseja continuar desenvolvendo sua missão na terra sem as influências do mundo moderno. Essa recusa pode ser notada claramente no famoso documento papal Syllabus Errorum Modernorum (Silabo dos Erros Modernos). Este documento refletia o esquivar-se da Igreja em aceitar que o Estado, baseado agora no liberalismo político, não mais a subsidiasse e, por fim, declarasse a laicidade estatal.

Porém, migrando lentamente durante a primeira metade do século XX de um pensamento que desejava um reforço dos laços entre ela e o Estado a um pensamento que via na separação das esferas e na liberdade de consciência, baseado em garantias constitucionais, um ganho para o homem e seus direitos e mesmo para sua atuação evangélica, a Igreja chega a assumir sua defesa juridicamente com o Concílio Vaticano II. Com o maior concílio da história do cristianismo, e sua famosa Declaração Dignitatis Humanae, a Igreja se compreendeu como um baluarte da liberdade de consciência, da liberdade religiosa, e assim sendo, dos direitos humanos.

Nunca é demais lembrar essa fecunda declaração em um momento no qual alguns grupos desejam limitar a religião ao espaço privado, sem permiti-la trazer sua contribuição calcada em séculos de história: “o cuidado pelo direito à liberdade religiosa pertence tanto aos cidadãos quanto aos grupos sociais, tanto aos poderes civis quanto à Igreja e às demais comunidades religiosas, cada qual ao seu modo [...]” (DH, 1549).

Benoît XVI em França: um blog de La Croix

A França espera a chegada de Bento XVI e o La Croix inaugura um blog para acompanhar a visita papal. A espera é grande e a ansiedade sobre um pronunciamento sobre a laicidade é o mais esperado entre jornalistas e estudiosos.

Bento XVI na França

O tema da laicidade hoje, num mundo "pós-secular", como nos falaria Habermas, é um dos temas mais quentes do momento. Depois então da negação por parte de alunos e professores da Sapienza de um pronunciamento de Bento XVI por ocasião da abertura do ano acadêmico, o tema pegou de vez. Agora teremos mais um capítulo do debate: a visita do papa à França. Pelo que se fala pela net, Ratzinger fará um discurso sobre a laicidade. Quando esteve nos Estados Unidos o fez, salientando o caráter positivo naquele país. Agora, na França... Segundo o cardeal Bertone, os franceses devem ultrapassar os fatos de sua história, marcada por laicismo raivoso, e caminhar para uma laicidade positiva. O papa não deve fugir dessa linha, ainda mais que tem Sarkozy, parece, como aliado na defesa das raízes cristãs da Europa.

Hitchcock católico?


Alfred Hitchcock católico? Pois é. Parace que um dos maiores diretores do cinema noir era católico e é possível, a partir de uma análise cuidadosa de sua obra, chegar nas influências da religião em seus filmes. Claro que isso é uma hipótese. A discussão sobre sua filiação religiosa é hoje bastante discutida. Em seu livro Alfred Hitchcock: a Life in Darkness and Light, Patrick McGilligan's sustensa a tese de que é possível encontrar em sua obra pontos que refletem um profundo catolicismo . De fato, é uma boa hipótese. Um filme que passo para meus alunos, Rope (Festim diabólico na traduçao para o português), o tema filosófico e religioso é claro: um niilista que se crê como um ser superior e que, consequentemente, crê na possibilidade de poder matar os "inferiores" em vista de sua superioridade e de um mundo no qual descobre que os valores morais são invenções meramente humanas e culturais. Boa hipótese essa de MacGilligans's, boa hipótese...

Livro sobre Bento XVI

A enviada especial do La Croix à Roma, Isabelle de Gaulmyn, acaba de lançar um livro sobre o papa Bento XVI: Benoît XVI, le pape incompris. Byard, 14,50 euros. A autora visa criticar posições baseadas em clichês e no desconhecimento da vida de Joseph Ratzinger e seu papel nos anos do pontificado de João Paulo II. Partes do livro podem ser lidas em francês, aqui.

Rápidas

- Ex-alunos de doutorado e pós-doutorado de Joseph Ratzinger tomaram a iniciativa de constituir uma Fundação Ratzinger/Bento XVI a fim de estudar os textos do papa. O objetivo principal da fundação seria o de promover a teologia a partir do pensamento e espírito do papa.

- Na sessão Lectures do The Catholic Herald encontra-se belo texto do cardeal Walter Kasper sobre sobre John Henry Newman.

- Saiu um segundo volume das memórias do controvertido teólogo Hans Küng,e por sinal, bem caro (Disputed Truth: Memoirs Volume II, Continuum £30). Como se sucede com todos os teólogos "dissidentes", depois do "cala-te boca" vindo de Roma, Küng tornou-se mais influente e conhecido. Pra ver o "nível" de polêmica pelo qual Küng caminha aí vai uma citação: "the ominous Opus Dei ... this Fascist-type Catholic secret organisation". Sobre Ratzinger como prefeito para a Congragação da Doutrina da Fé exclama: "a technique of insinuation and a polemic of defamation which hardly allows him to recognise the truth of another position". É o espírito anti-romano, como diria von Balthasar, que perpassa a obra de Küng.

Nova edição de Ortodoxia de Chesterton


Alegrem-se! Fomos brindados por uma nova edição de Ortodoxia de G.K. Chesterton em comemoração ao seu centenário. Com ótimo preço, míseros R$19,90, o leitor poderá se deliciar e beneficiar da retórica exemplar desse que foi um dos maiores literatos cristãos do século XX. Veja aqui no próprio site da editora.

Pondé na escuridão

Segue um trecho de texto de Pondé hoje na Folha de S. Paulo:

Na escuridão

SOU PROFESSOR , entro em sala todos os dias. Minha impressão básica é que o que falta muitas vezes na sala de aula é falarmos "a verdade". Apesar de ser um cético em quase tudo, acredito que há uma milagrosa relação entre o ser humano e "a verdade" quando ele percebe que ela é dita sem medo.
Uma grande traição feita aos mais jovens é atolá-los em "teorias a serviço da emancipação". Eu não quero emancipar ninguém porque para isso teria que mentir. Mentimos para sobreviver, isso é normal e civilizado, mas na sala de aula é uma traição.
Calma, caro leitor! Sei que "cada um é cada um". Uma afirmação forte como essa, "a verdade", pode me custar muitos amigos. Nunca mais jantares inteligentes. Hoje em dia você aprende no jardim da infância que "tudo é relativo", "a verdade" não existe, e todos os males do mundo são fruto do patriarcalismo e da Igreja Católica. Caricaturas ridículas da história são feitas a serviço da "liberdade"! Palavra já banal, quase idiota.
Existem também as palavras de ordem que devem ser ditas em meio às taças de vinho. Vejamos algumas delas: sou a favor do aborto, do casamento gay, da comercialização de fetos abortados (não! Essa ainda não é comum...) e não existe pecado. Qualquer coisa diferente, e de novo a ameaça: não te convido mais para jantar em casa. Não vou entrar no teor em si desses clichês e, falando sério, acho que há muito sofrimento verdadeiro nesses dramas humanos. Uma boa dose de auto-estima se faz necessária para não cairmos de joelhos diante desta "nova repressão". Toda fórmula para chegar à auto-estima é falsa, por isso resta-nos o sorriso da sorte ou da morte.
Quando falo "a verdade", me refiro a coisas mais simples do que debates filosóficos intermináveis sobre a natureza da verdade absoluta ou a existência de Deus. Refiro-me à luta cotidiana com nossa caótica condição humana e ainda termos que manter o bom humor e pagarmos as contas.
Refiro-me àquilo que gente como Ítalo Calvino chama de "dramas clássicos". O problema é que para ensinar isso, antes de tudo precisamos conhecer "isso" (coisa que vai ficando rara em meio ao blábláblá do relativismo cultural e da democracia no ensino). E pior, não podemos ter medo. Um dos dramas humilhantes do "otimismo moderno" é que para ser otimista temos que ser idiotas e negarmos os impasses assustadores da vida.
Explico-me: acho que os mais jovens agüentam ouvir "a verdade" mais do que professores de meia-idade. Esses professores já perceberam que a vida não é a bobagem das utopias de Maio de 68, tipo "sexo livre e é proibido proibir", mas se calam diante dessa dolorosa consciência...