Meu questionamento parte do fato do acordo entre o Brasil e Vaticano. O juízo da Igreja e seus dirigentes em relação à importância dessa concordata é só deles. Não preciso ser mais um que "saiba" o que é bom ou não para a Santa Sé. Esse tipo de falatório, já temos aos montes. A questão, que passou a surgir nas minhas débeis reflexões nesse interím que o documento foi aprovado pela Câmara, é qual preço a Igreja católica brasileira teve e terá que pagar para que a concordata fosse aprovada. Como visto, além do acordo Brasil-Vaticano, foi também aprovada uma lei das religiões. Dois fatos importantes: primeiro, o núncio apostólico recebe a polêmica figura de Fernando Collor para pedir apoio à aprovação do documento. Segundo, sob as pressões da bancada evangélica na Câmara, uma outra lei, similar, senão quase identica - troca-se algumas referências à Igreja romana por outras religiões - também é aprovada. Até que ponto a Igreja brasileira cedeu para que fosse aprovado o acordo defendido?
Clóvis Rossi, hoje na Folha de S. Paulo, trouxe algumas palavras do deputado Chico Alencar , do PSOL do Rio de Janeiro, sobre como se chegou aos acordos e que reverbera, de qualquer modo, meus pressentimentos:"Se o acordo Santa Sé/governo brasileiro já era questionável em vários aspectos, o acordão com setores evangélicos (não a totalidade), patrocinado por quase todos os partidos (inclusive o "oposicionista" DEM), à exceção do PSOL, foi um absurdo. O projeto tramitou numa celeridade inédita (foi apresentado em julho agora) e, com o relator Eduardo Cunha (PMDB-RJ, neoevangélico), avançou a toque de caixa em plenário, sem ter sido nem sequer proposto no colégio de líderes [...] "É o liberou geral. Agora, quem inventar uma "instituição religiosa" terá sua organização obrigatoriamente reconhecida pelo Estado no simples ato de criação, independentemente de lastro histórico e cultural, doutrina, corpo de crença. É o supermercado aberto da "fé". E a "instituição" poderá modificar à vontade suas instâncias. E suas atividades gozarão de todas as isenções, imunidades e benefícios -fiscais, trabalhistas, patrimoniais- possíveis e imagináveis".
A partir das palavras do deputado e do dito "acordão" que foi feito com alguns setores da bancada evangélica para que o acordo Brasil-Vaticano fosse aprovado pergunto-me: Será que a Igreja brasileira, ao se "conchavar" com tais setores para que a concordata fosse aprovada não correu o risco de assim abrir espaço para aqueles evangélicos - pois sabemos que existem evangélicos e evangélicos - que buscam fiéis no "mercado de bens da salvação" brasileiro a partir de um discurso proselitista agressivo e que se pauta por defesa de sua identidade religiosa com ataques - vide o famigerado caso do "chute da santa" - a outras denominações religiosas? Será que o artigo 11, que institui o ensino religioso nas escolas públicas - isto é, o ensino desta ou daquela religião, de acordo com o pedido dos alunos - não abre espaço para uma guerra proselitista no âmbito escolar? Será que a Igreja católica brasileira, que tem os evangélicos de forma geral como a maior ameaça a sua hegemonia, ao assumir tal "acordão" não abriu ainda mais a guarda?Resumindo: Será que a Igreja brasileira, com sua defesa da aprovação do acordo, não deu um tiro no pé?
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