No dia 18 de outubro de 2008 realizou-se no auditório da reitoria da Universidade Federal de Minas Gerais o debate “Fé e conhecimento: a perspectiva do cientista, do poeta e do monge”. (a gravação completa encontra-se no site www.fafich.ufmg.br/~laps) O público no local foi em torno de 400 pessoas, além das 500 que acompanharam ao vivo pela internet, entre eles, muitos estudantes, professores e interessados pelo tema. O sucesso do debate demonstra que quando existe algo a ser falado, quando esse algo corresponde à interioridade do ser humano, quando o insere no jogo de ouvir, pensar, situar-se e implicar-se no que é dito, é possível agrupar um bom número de pessoas para refletirem juntas.
Ao perguntar-se se é possível articular fé e conhecimento, se são duas vias paralelas e que não se cruzam e se a fé é simplesmente acreditar cegamente em algo, as pessoas se sentem incitadas a pensarem suas próprias convicções e condutas. Ao perguntar-se sobre as razões de afirmações mais basais, de nossas vivências e experiências, lançamo-nos num desafio instigante de pensarmos nós próprios frente a um mundo que se transforma numa velocidade jamais vista. Em meio a tantas mudanças existe algo em mim que posso chamar de inato? Existe algo no homem que o constitui como ser?
Para a poetisa Adélia Prado, que esteve conosco nesse encontro e que nos possibilitou vislumbrar a relação entre fé e conhecimento a partir do fazer poético, a resposta é sim, e o sentimento moral é uma dessas coisas. Segundo a poetisa, “o mundo já nos é dado com suas órbitas, leis, sentimentos do bem e do mal”. A sensibilidade ética, para Adélia Prado, “já nasce conosco e ela nos persegue feito um aguilhão. É o instinto da alma, o instinto religioso que é a tendência que a alma, o espírito humano, tem de procurar aquilo que justifique a existência, o absurdo do fenômeno da nossa existência e a do mundo, alguma coisa que justifique a existência num centro de significação e sentido: o que? Por quê? O que sou? De onde vim? Para onde vou? Por que sofremos?”
Transitando do olhar poético ao pensamento místico cristão, a poetisa mineira afirma que “a alma humana quer encontrar algo que a descanse; um descanso da nossa humanidade, da nossa finitude que fica permanentemente querendo uma coisa infinita.” E assevera: “Ninguém é insensível a essas exigências”. Ninguém é insensível às exigências primeiras do coração humano. As exigências primárias de felicidade, liberdade, bem e verdade. Para a poetisa, é da “da experiência de nascer, sofrer, morrer, alegrar-se é que nascem religiões, ciência, filosofia e arte. Sem esses aguilhões nós estaríamos ainda no mesmo lugar. É isso que provoca e é a pulsão daquilo que nós chamamos de civilização e humanização [...] É a religião e a arte [...] por que escapam da cadeia da lógica [...] propiciam ao homem a chance de viver a vida simbólica”. A crítica de Adélia Prado vem nesse sentido: atualmente vivemos um vazio simbólico, que leva o homem a essa secura espiritual tão marcante nos tempos atuais.
Na verdade, poderíamos afirmar, que temos sim uma vida simbólica na chamada pós-modernidade, hiper-modernidade ou super-modernidade, como queiram chamar esses tempos os estudiosos. Contudo, uma parcela dessa vida simbólica que qualquer olhar mais atento flagra gira em torno dos shoppings, templos de consumo aonde o espaço público é privado e restrito e aonde o grande ato sacrificial se dá nas faturas por serem pagas. Tal vida simbólica dá-se na relação estabelecida pelo próprio consumidor-fiel e seus novos totens, adquiridos quase com confiança religiosa em sua tarefa libertadora e salvífica. O ato da compra (ou do débito) é convertido em prática sacramental, e suas conseqüências são sinais na alma de um alento momentâneo e quase um êxtase orgiástico, dependendo do totem adquirido. O produto não é um simples produto. Além de suas funções primárias ele nos possibilita um caminho para o céu: invejado e desejado pelo outro, o totem e sua utilização tornam-se caminhos de salvação que visam nos fazer crer que somos únicos e insubstituíveis aos olhos do Deus-Mercado. À religião do consumo, uma das marcas da vida simbólica atual, não somos imunes. Ajoelhamos permanentemente para os nossos totens, dignos de adoração e veneração, mas assinalados com seus prazos de validade em decorrência da mão-invisível do Deus –Mercado, que deve proporcionar novos e mais eficazes totens para encher nossos templos e nos fornecer melhores caminhos de salvação.
3 comentários:
Passa no Minha Vereda para recebe-lo! Abraços!
Abçs,
Dener.
Rodrigo
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