Orwell Diaries


A partir de 9 de agosto George Orwell terá um blog... Um post-blog, na verdade. Ele trará partes de seus diários, escritos entre 1938 e 1942. Vale a pena conferir um dos maiores críticos do totalitarismo moderno. Alguns pequenos trechos já se encontram aqui. E quem ainda não leu 1984 e A revolção dos bichos perde a oportunidade de saborear a maestria desse grande escritor em fazer tal crítica de forma sagaz e brilhante.

O papel de Pio XII para uma hermenêutica conciliar


Está no ar o Comitato Papa Pacelli.

De acordo com alguns leigos e estudiosos da Igreja do século XX, compreendendo-se melhor Pio XII e seu papado compreende-se melhor o Concílio Vaticano II e elabora-se uma hermenêutica mais sana do evento conciliar. O que já tento fazer há algum tempo e que Danielle Menozzi também fez brilhantemente em seu Giovanni Paolo II: una transizione incompiuta?. Entre os que dão apoio à iniciativa afirma-se que "a Igreja do concílio é devedora a Pio XII tanto quanto o papa João XXIII [...] se olham os minutos das discussões dos padres conciliares o seu nome é citado em 1500 intervenções. Nas notas dos documentos conciliares é citato outras 200 vezes. É a citação mais recorrente, fora as das Sagradas Escrituras". Se no Brasil tivéssemos lugares de debate sobre tais questões, como paróquias, pastorais e universidades, irámos fazer um grande serviço à compreensão da Igreja e sua história contemporânea. Menos confusa e ideologizada, mais clara e verdadeira.

Site litúrgico

Está no ar um site americano muito interessante e bem documentado sobre liturgia no The Liturgical Institute da University of Saint Mary of the lake, em Illinois, EUA. Se possuir alguma dúvida sobre o tema é só mandar um e-mail que eles respondem prontamente.

O Concílio, Paulo VI e o "balzo"

Foi lançado em Roma o trabalho "Il Concilio in mostra". Com a colaboração da Rai Tre e organizado pelo Istituto Giovanni XXIII per le Scienze Religiose de Bologna (FSCIRE), fundado por Giuseppe Dossetti em 1953, unha e carne com o Cardeal Lercaro, um dos propugnadores da abertura conciliar, tendo como cabeça por anos Giuseppe Aberigo e hoje à sua frente Alberto Melloni, o instituto é o baluarte da "hermenêutica descontínua" do Vaticano II. De acordo com Paolo Rodari, Melloni redescobriu o "balzo in avanti" que João XXIII queria fazer do concílio. Contudo, parece mais equilibrado ao defender que olhar o evento como uma disputa entre um lado pogressista e outro conservador é no mínimo redutivo.Por algumas palavras de Melloni já é possível inferir como entende o papel de Paulo VI: incapacidade de levar à termo o "balzo in avanti" desejado pelo predecessor. Tal ponto é uma das características centrais de tal hermenêutica. Montini como um bonquinho da minoria conservadora, que o pressiona ilimitadamente até arrancar algumas vitórias. Vide a "nota praevia".

Poulat e o integrismo nas origens


Se deseja um livro que explique o integrismo em seus fundamentos primeiros, e que vai refletir em Lefebvre e cia, nada melhor que uma das obras centrais de Émile Poulat intitulada Intégrisme et catholicisme intégral. Nela o historiador aborda a La Sapinière (1909-1921), a rede secreta internacional antimoderna, encabeçada por Humberto Benigni, surgida no pontificado de Pio X e desmantelada por Bento XV. A rede tinha como escopo principal lutar contra o movimento modernista e levou à cabo um verdadeiro "caça às bruxas", denunciando padres, seminários e todos aqueles que simpatizavam com o pensamento de Alfred Loisy, Blondel e outros. O livro de Poulat traz uma série de cartas entre os integrantes da rede e autoridades eclesiásticas.

Texto de Voegelin sobre a Reforma Protestante

Ótimo texto de Eric Voegelin sobre a Reforma Protestante. O filósofo austríaco lança um olhar geral sobre o tema e, em uma das partes, afirma que "o que mais surpreende é a incapacidade do doutrinário em prever as consequências das suas doutrinas. Ao substituir a concentração da infalibilidade eclesial, fazendo de cada cristão um 'Papa', abria a porta a intermináveis disputas."

Rito antigo move fiéis

A possibilidade de celebrar a missa tridentina está fazendo muitos católicos se moverem em sua busca. Na Inglaterra e no País de Gales está circulando uma petição pedindo aos bispos que possibilitem mais usualmente a missa no rito antigo, pelo menos aos domingos. Segundo Eveline Booth, a idealizadora da petição, a experiência de uma missa no rito antigo "it was a much more reverent experience". Por acaso sabem se no Brasil existe alguma iniciativa parecida que não se concentre nos círculos "tradicionalistas"?
Outra notícia que também vem dos britânicos sobre a contenda da missa antiga é a da negativa dada pelos padres da proposta de se instituir uma igreja dedicada especialmente ao culto de São Pio V. Colocar em prática o moto proprio Summorum Pontificum não seria tão fácil como acreditavam os seus entusiastas.

Notícias do inferno


Fitafuso, o diabo-instrutor, vamos assim dizer, do ótimo texto Cartas de um diabo a seu aprendiz (Martins Fontes), de C. S. Lewis profere uma interessante assertiva sobre a realidade do sagrado e seus "tentadores".

"A fina flor da profanação só pode crescer se for plantada perto do Sagrado. Em nenhum lugar a nossa tentação é tão bem sucedida quanto nos próprios pés do altar"


Qualquer situação atual que remeta à essa frase é mera coincidência...

Mas, "o que buscais?"


Publicado no Jornal O Lutador de Belo Horizonte em 21 de julho de 2008

“O que buscais?”: a pergunta que não quer calar

“O que buscais?” (Jo 1, 38). Essa pergunta curta, mas profunda em seu significado, é uma das mais prementes da existência de um homem e de uma mulher. Nela está contida toda uma vida, toda uma trajetória por se fazer, até mesmo uma memória a se construir. “O que buscais?”, na verdade, é uma pergunta curta, mas nada fácil. Em sua brevidade sintática impõe-se todo o destino de um ser humano em vistas de sua plena realização. Contudo, quem se interessa em respondê-la? Quem despende algum tempo na investigação de sua resposta? Num mundo marcado pelas necessidades materiais mais básicas, pelo corre-corre diário em vista de outras tantas “necessidades materiais” não tão básicas assim, o homem contemporâneo não tem tempo para tal investigação. Não tem tempo para uma investigação de si mesmo, de seu destino. Como nos diz D. Giussani, “normalmente na vida, para todas as pessoas, é sério o problema do dinheiro, é sério o problema dos filhos, é sério o problema do homem e da mulher, é sério o problema da saúde é sério o problema político. Para o mundo, tudo é sério, exceto a vida”. Ao agir, sem seriedade frente ao “problema da vida”, o homem torna-se menos humano, pois uma das grandes características do ser humano é perguntar-se sobre o sentido, a vida e o sentido da vida. Sei bem que nem todo mundo tem vocação para filósofo, o que seria um contra-senso da natureza se assim o fosse. Entretanto, existe uma vocação inata a todos os seres ditos humanos: pensar. A razão, como demonstrou um dia o filósofo grego Aristóteles, é o principal atributo do homem, de sua natureza. Assim, como nos diz o papa Bento XVI, não usá-la é ir contra Deus, a Razão Universal, o Logos originário, o Verbo, do qual comungamos como criaturas pensantes.

Mas “o que buscais?” Todo mundo procura por algo, todos os indivíduos buscam a felicidade, a paz, o amor, a verdade. Conscientemente ou não, as pessoas, nos cantos mais recônditos de seus corações, anseiam pelo todo, pelo significado de tudo a sua volta. É a saudade das coisas que ainda não foram, uma nostalgia, não raras vezes melancólica, do tudo, de se ver realizado completamente. De se ver amado, querido, acolhido e levado a sério. Na nossa passagem terrestre encontramos algumas pessoas que apontam nesse caminho e se encontram em torno de nós. Nossos pais, nos primeiros momentos da vida, alguns amigos e companheiros que encontramos nos esbarrões da vida cotidiana, nossa esposa ou esposo. Porém, como somos humanos, e o humano cai, erra, equivoca-se, o amor, a compreensão, o cuidado, são sempre limitados, mesmo quando exercido com o coração mais puro. Contudo, isso não tira o seu valor intrínseco. Aliás, assinala, expõe e descortina a constituição de nosso ser. Realça o que realmente nos falta e remete Àquele a quem nos dá tudo e nos sustenta em nossas fragilidades e debilidades: Deus Pai. Nosso início, meio e fim.

“O que buscais?” Essa pergunta de Jesus quer nos fazer pensar, refletir e assumir o nosso papel como pessoas na realidade circundante. Quer que assumamos nossa humanidade profundamente. Quer nos colocar frente a frente com nós mesmos, fazendo-nos assumir toda a realidade, todo o Mistério que a constitui. Jesus nos convida para que tomemos posse dela. Tomar posse dessa realidade que nos transcende, que vai além de minha capacidade de compreensão, é tomar posse de si mesmo. É encontrar-se. E encontrar-se é encontrar com Aquele Outro que nos constitui por inteiro, onde se dependura nossa existência. Desta forma, a liberdade, anseio humano dos mais profundos, é a nossa capacidade de aderir a essa realidade, afirmá-la continuamente, pois só assim afirmaremos também o homem e começaremos a cumprir nossa missão de instituir um humanismo integral.

Pérolas de Maritain em Le Paysan de la Garone


Contra a falsa afirmação de que Maritain é um daqueles "arrependidos" do concílio, (Alberto Melloni e outros) posto alguns textos do intelectual escritos em 1966, ou seja, um mês depois da conclusão dos trabalhos conciliares. Nota-se que seria muito pouco tempo para Maritain ter se arrependido do concílio. Por alguns trechos que seguem é possível ver que ele não se arrepende do concílio, mas chama atenção para os problemas que surgem daqueles que desejam fazer dele um momento de novidade completa e absoluta, sem se preocuparem com a longa duração da Igreja. Bem, faço algumas reflexões, em vermelho, de alguns trechos. Espero que possa ser útil para os aficcionados pela história da Igreja. Se desejarem citar algum dos trechos, a página da onde foi retirado segue logo depois da citação.

Maritain, Jacques. O camponês do garona: um velho leigo no concílio. Lisboa: União Gráfica, 1967. [originalmente publicado em França em 1966]


"desde o princípio e pela própria vontade de João XXIII, foi ele mais pastoral do que doutrinal [...]. E é claro que isso repondia a um desígnio providencial; porque a tarefa histórica, a imensa renovação que devia levar a bom termo, dizia respeito ao progresso mais na tomada de conscência evangélica e na atitude do coração do que nos dogmas a definir. Mas, meu Deus, não estavam já definidos esses dogmas, e para sempre? [...] Não está, porventura, fundada a doutrina da Igreja na certeza e sobre bases tão sólidas para permitir que progrida indefinidamente, por todos os Concílios precedentes e por um trabalho secular? Que homem haverá, que, tendo recebido a fé teologal, seja tão louco para imaginar que certezas eternas se criam por agitar-se, abrindo dúvidas a pontos de interrogação, podendo liquefazer-se ao sabor do tempo? (p. 13) Quais homens, Maritain?! Muitos! A noção de que o Vaticano II inicia "momento novo" é recorrente. E em si não está equivocado. Contudo, com essa noção pensam que tudo pode ser transformado, inclusive a doutrina multisecular...


"As almas estão ávidas de autentcidade, de franqueza, de dedicação a uma tarefa comum; descobrem com uma espécie de embriaguez o mistério do ser humano, as possibilidades e os requisitos do amor fraternal. É como que uma nostalgia do Evangelho e de Jesus" (p. 14). Ou seja, o Vaticano II veio a termo devido, inclusive, por essa sede do mistério humano, essa nostalgia de Cristo e sua vida.


"Tendo em vista a febre neo-modernista bastante contagiosa, pelo menos nos círculos denominados 'intelectuais', comparado com a qual o modernismo de Pio X não é senão uma modesta febre dos fenos, e que encontra expressão sobretudo nos pensadores mais avançados entre os nossos irmãos protestantes, mas que também é activa nos pensadores católicos igualmente avançados, esta segunda descrição dá-nos o quadro de uma espécie de 'apostasia imanente' (compreendo que ela está decidida a ficar cristã a todo o custo), em preparação já de há muitos anos, levantadas aqui e acolá por ocasião do Concílio, aceleram a manifestação - mentirosamente imputada, às vezes, ao 'espírito do Concílio', isto é, 'ao espírito de João XXIII'. Sabemos muito bem a quem se deve atribuir a paternidade de tais mentiras (e tanto melhor se assim o homem fica um pouco desonrado) [...]" (p. 15) Essa é a parte, ao meu ver, mais importante do texto do filósofo. Maritain aponta que o modernismo combatido por Pio X nada mais é do que um pequeno resfriado perto da "febre modernista" que no concílio, e no pós-concílio, se sucedeu. E tal "febre" se liga ao famoso termo dito insistentemente por João XXIII, aggiornamento e aquele "espírito do concílio", compreendido de forma abstrata e sem dizer muita coisa. Melhor dizendo, tais conceitos dizem muito, mas para aqueles que fazem deles mantras de intenções não raras vezes descompromissadas com a verdade, e que visam, em último lugar, como se fosse possível ocorrer, a mudança essenciais da fé cristã. Ah! Daria um rim para saber que é esse que Maritain acusa como o pai de tais mantras...Alguém sabe?!


"Temos de por letras minúsculas por toda a parte. 'Tudo é relativo, eis o único princípio absoluto', já nos dizia o nosso Pai Augusto Comte [...] Acrescento, porém, que ele era mais honesto que vós, estudiosos expurgadores das verdades reveladas: porque os mitos da sua 'Síntese subjectiva' fabricava-os ele, decidida e francamente com todas as peças, e não, como vós fazeis, reinterpretanto toda uma herança religiosa à qual vos julgais mais fiéis que ninguém, mas procurando enganar a sede e o coração daqueles de cuja fé imaginais participar" (p. 17)


"o que importa ressaltar é que o modernismo desenfreado dos nosso dias é irremediavelmente ambivalente. Tende por sa natureza, embora o conteste, a arruinar a fé cristã, envidando os seus melhores esforços para a esvaziar de todo o conteúdo. Mas a verdade é que há um bom número de indivíduos que o aceitam como um esforço para dar a esta fé uma espécie de testemunho desesperado. Porque é sinceramente, não há dúvida, e por vezes na febre e na angústia de uma alma profundamente religiosa, que os corifeus do nosso neo-modernismo se declaram cristãos." (p.18) Maritain desculpa os "neo-modernistas" pela, vamos dizer, boa vontade de dar testemunho no meio de tantas incertezas...São sinceros no erro, diríamos...


"não é de admirar que tantos modernistas acreditem ter a missão de salvar para o mundo moderno um cristianismo agonizante - o seu cristianismo agonizante? É para esse objectivo que eles se dedicam como bons soldados de Cristo realizando um trabalho esgotante de hermenêutica. E o seu fideísmo, por muito contrário que seja à fé cristã, é, contudo, um testemunho sincero e atormentado prestado a esta fé." (p. 19)


"o seu cristianismo [...] o motivo principal, contudo, ao qual dão, cegamente, uma prevalência absoluta, é na realidade um desejo ardente de fazer passar à história o testemunho do Evangelho. Ainda uma extravagância da natureza humana: é com uma fé atormentada, e também mal iluminada, mas uma fé sincera em Jesus Cristo, que eles atraiçoam a Igreja à força de a quererem servir (à sua maneira)" (p. 20).

Falando sobre o concílio:

"No que diz respeito à atitude do cristão para com o mundo, o pêndulo desloco-se, de repente, para o extremo oposto do desprezo quase maniqueu do mundo professado no ghetto cristão, do qual está prestes a evadir-se. E, desta vez, não é diante de uma aberração projectada para dentro, sob formas torturantes e tenebrosas que nos encontramos; é, sim, diante de uma aberração projectada para fora com todo o brilho e a feliz arrogância de uma razão dementada pela embriaguez da novidade: segundo fruto venenoso, tão perigoso, e, porventura (por causa deste carácter intelectual), mais perigoso que o primeiro, mas que será provavalmente de menor duração, que o longo equívoco de que estou aqui tratando: porque, quando a loucura assume, entre os cristãos, dimensões consideráveis, torna-se necessário ou que ela desapareça rapidamente, ou que os afaste, decididamente, da Igreja. Mas que loucura? O ajoelhar-se diante do mundo." (p. 68). Em qual ponto será que nos encontramos?


"o Papa recomendou-nos que o aggiornamento não é, de modo algum, uma adaptação da Igreja ao mundo, como se este houvesse de regulamentar aquela; é pôr em dia posições essenciais da própria Igreja. Pois bem, a insistência do esquema XIII [Constituição pastoral sobre a condição humana no mundo de hoje] sobre a pessoa humana é uma notável ilustração dessa verdade. Efectivamente o que ali aparece, é um contraste chocante entre a Igreja e o mundo. Nesta comunidade de pessoas humanas que é uma sociedade, a Igreja, conforme as exigências da verdade, dá o primado à pessoa sobre a comunidade, ao passo que o mundo de hoje dá primazia à comunidade sobre a pessoa. Desacordo bastante significativo, e de alto interesse. Na nossa idade de civilização, a Igreja tornar-se-á, cada vez mais - e bendita seja Ela - o refúgio e o apoio, porventura único, da pessoa [...] Considerando-se, portanto, na perspectiva do Genesis e da Suma Teológica, ou por outras palavras, considerando a natureza humana e o mundo, naquilo que os constitui em si mesmos, a Constituição pastoral afirma de ambos, sem rodeios, a sua bondade radical e o apelo para o progresso que pode ser contrariado, ou pela ambiguidade da matéria ou pelas feridas do pecado, mas que se encontra inscrito na sua essência. E mostra, de uma maneira, não só geral, mas numa análise muito puxada e com aquela inteira generosidade que decorre da divina caridade, como a Igreja, permanecendo sempre no domínio da sua missão toda espiritual e das coisas que pertencem a Deus, pode e quer ajudar o mundo e a espécie humana no esforço para avançarem para os seus fins temporais. A dizer a verdade é a doutrina perenal da Igreja que se encontra, assim, reafirmada - mas com notas novas e singularmente importantes: porque ela é reafirmada sob o signo da liberdade - não para reivindicar o direito da Igreja intervir ratione peccati nas coisas do mundo, para nele reprimir o mal [...], mas para declarar o seu direito e a sua vontade de animar, estimular e assistir do alto, ratione boni perficiendi, por assim dizer, e sem invadir a autonomia do temporal, os desenvolvimentos do mundo para um maior bem a atingir." (p. 69). Nunca havia lido nada parecido. Maritain consegue achar na Constituição tal relação entre a Igreja e o mundo. Profético.


"Também é verdade [...] que o segundo Concílio do Vaticano foi o anúncio de uma idade nova. Desta, o próprio Concílio [...] indicou os grandes traços, ao passo que aggiornamentava os eternos tesouros da Igreja, graças a uma tomada de consciência mais profunda e a uma melhor explicitação de certas verdades encerradas nestes tesouros. Por outro lado, podemos notar que, por um paradoxo que não é raro na história humana, acontece que aquilo que é disforme e torcido vai à frente do que é direito, assim como os produtos da imitação batem os produtos autênticos" (p. 84). Como disse anteriormente, o Vaticano II pode ser compreendido como um momento novo na história da Igreja...Mas a parte marcante desse trecho é a questão da própria recepção do concílio. Em 1966 Maritain já via as contendas e as interpretações equívocadas do concílio. O "que é disforme e torcido vai à frente do que é direito". É a nossa situação atual. Quando o "direito" se imporá só Deus sabe!


"O verdadeiro fogo novo, as descobertas autênticas que se produzirão na idade nova em que entramos, e pelas quais, nas perspectivas históricas abertas pelo Concílio, a consciência cristã há-de penetrar mais para a frente, e mais profundamente na verdade de que ela vive e na realidade evangélica, nada terão que ver com a solicitação de velhos desejos recalcados e de ambições confusas, feita pelos agentes de publicidade do Velho Mentiroso, nem com o seu aranzel pseudo-científico e pseudo-filosófico, nem com aquela santa parusia do Homem, em nome da qual reclamam um ajoelhamento cristão diante do mundo. O verdadeiro fogo novo, renovação essencial, será uma renovação interior." (p. 83) Lindo! O Vaticano II exige uma renovação interior, conversão...


"Se não amarmos a verdade, não somos homens. E amar a verdade é amá-la acima de tudo, porque a Verdade, bem o sabemos, é o próprio Deus" (p. 108) Mais um tapa na cara do relativismo esquizofrênico.


"O integrismo é [...] um abuso de confiança cometido em nome da verdade: quer dizer, e a pior ofensa à Verdade divina e à inteligência humana. Apodera-se de fórmulas verdadeiras que esvazia do seu conteúdo e que põe a congelar nos refrigeradores de uma inquieta polícia dos espíritos [...] Nas fórmulas que ele gela, o integrismo vê e acarinha meios humanos de segurança - quer pela comodidade de intelectos que a fixidez tranquiliza dando-lhe com pouca despesa uma boa dose de fidelidade, de coerência interior e de firmeza; quer pela proteção, igualmente, barata, que estas fórmulas congeladas oferecem a pessoas constituídas em autoridade, que tomam todas as cautelas, ao manejá-las, prudentemente, a seu próprio respeito e rudemente a respeito dos outros; quer ainda pelas facilidades que proporcionam como instrumentos de proibição e de ameaça, mais ou menos oculta e de intimidação [...] o primado passa assim para a segurança humana com a necessidade de se garantir a si mesmo, psicológica e socialmente, graças aos diversos sistemas de protecção chamados por este primado da segurança, e cujo principal é um entusiasmo vigilante para denunciar seja o que for que se arrisque a pertubar isto, tudo isso; e aqui temos o abuso de confiança, tomando Deus como testemunha e em nome da santa Verdade" (p. 195). Clarificante definição. Se a carapuça servir que a vistem!


"pode o homem, através da graça, atingir a plenitude do conhecimento, e é bem capaz de pensar nessas realidades; todavia, em Deus mesmo, nenhum ser humano pode pensar. Portanto, eu desejo abandonar tudo o que posso pensar, e escolher para objecto de seu amor exactamente o que não posso pensar. Porque Deus pode muito bem ser amado, mas não pensado".
Anônimo, A nuvem do não-saber, século XIV.

Liberdade religiosa e Magistério eclesiástico

Como cristãos devemos sempre praticar a caridade e partilhar, sempre. Assim, a partir de uma pesquisa que estou desenvolvendo no Rio de Janeiro partilho algumas informações.
Bem, a tese da continuidade entre a Declaração Dignitatis Humanae e o Magistério da Igreja anterior ao Concílio Vaticano II tem seus defensores abalizados. Não é simplesmente um "é contínuo e pronto!", ou "é ruptura profunda, sem dúvida!", mas sim obras de envergadura baseados em estudos acurados. Quem quiser conferir vai aí duas dicas, em francês:


BASILE, Fr. O.S.B.. La liberté religieuse et la tradition catholique: un cas de développement doctrinal homogène dans le magistère authentique. 3 tomos. Barroux: Abbaye Sainte-Madeleine du Barroux, 1998.
Obra gigantesca. Três longos tomos: no primeiro Basile trata o assunto de forma sistemática; no segundo apresenta a tema cronologicamente, abordando o assunto a partir de uma visão histórica, dos Padres da Igreja até Paulo VI; no terceiro traz a bibliografia, imensa!, e o índice analítico.






MARGERIE, Bertrand de. Liberté religieuse et règne du Christ. Paris: Cerf, 1988.
O autor visa responder a mesma pergunta de Basile: a doutrina do Vaticano II sobre a liberdade religiosa está em contradição com o Magistério secular da Igreja? Como o monge beneditino responde negativamente. Interessante da obra que ela traz vários anexos, com texto de Monsenhor Emile-Joseph DE SMEDT (Continuité et progrès dans le enseignements d magistère), Monsenhor LE FEBVRE (Liberté religieuse et loi divine, Monsenhor Alfred ANCEL (Le fondement ontologique de la liberté religieuse: l'obligation de chercher la vérité, e mesmo um do então cardeal Karol WOJTYLA (Liberté religieuse et responsabilité personnelle).

Ecône

Na linha da hermenêutica da continuidade e no calor do fatos, Margerie trata do "caso Lefebvre" nessa obra: MARGERIE, Bertrand de. Ecône: comment dénouer la tragédie; Réflexions Théologiques et Pastorales. Paris: Tequi, 1988.
São Bento, rogai por nós!

A capafobia no mundo progressista


João XXIII e sua capa

De acordo com Gerald Warner, em um texto da Telegraph, uma fobia se alastrou no mundo progressista: a fobia da cappa magna choralis, que teria começado no pontificado de Pio XII. Quem quiser saber mais sobre ela veja aqui.

A esperança salva

Bento XVI em uma de suas respostas para os jornalistas no avião que os levava à Austrália:

"Temos necessidade do dom da terra, do dom da água, precisamos do Criador; o Criador volta a aparecer em sua criação. Deste modo, compreendemos que não podemos ser realmente felizes, não podemos promover realmente a justiça para o mundo inteiro, sem um critério, sem um Deus que é justo, e que nos dá a luz e a vida. Portanto, penso que em certo sentido se dará uma crise para nossa fé neste «mundo ocidental», mas sempre teremos um renascimento da fé, pois a fé cristã é simplesmente verdadeira, e a verdade estará sempre presente no mundo humano, e Deus sempre será a Verdade. Neste sentido, em último termo, sou otimista."


Livreto sobre a questão dos missais


Na onda da discussão sobre o motu proprio Summorum Pontificum, que completou um ano dia 7 de julho passado, muitos artigos e livros saíram logo sobre a questão. Um pequeno livreto italiano, publicado logo depois do moto proprio, dá uma visão geral sobre a questão: SODI, Manlio. Il Messale di Pio V. Perché la Messa in latino nel III millenio?. Padova: Edizioni Messaggero Padova, 2007. ( 3,50 euros).
Trecho: "[...] e per saper valutare la campagna midiatica che in genere non ha colto il nocciolo del problema, in quanto si è soffermata principalmente sul ritorno al latino nella Messa; ma la Messa in latino è sempre stato possibile celebrarla! (grifo nosso) [sempre foi possível celebrar a missa em latim!]" (p. 5).

Boff vs Boff by Magister

Como não poderia deixar de ser, Leonardo Boff respondeu às críticas de seu irmão, Clodovis Boff, em um artigo no iHu online... E a discussão já atravessou o mundo e se encontra no blog do italiano Sandro Magister. O vaticanista do Le Espresso afirma que "curiosamente, proprio colui che subentrò a Clodovis Boff sulla cattedra di teologia a Rio (nos anos 80), l'italiano Filippo Santoro, oggi vescovo di Petrópolis e appartenente a Comunione e Liberazione, è lo stesso che ha più ispirato e seguito la sua "conversione", durata qualche anno e infine sfociata nel saggio pubblicato sulla Revista Eclesiástica Brasileira." O assunto é polêmico e com certeza presenciaremos novos desenlaces. Tal debate pode ser muito rico, se lado a lado não desejar monopolizá-lo ideologicamente e estiver aberto à reflexão séria. Agora, pergunto: como manter um debate desideologizado sendo que a própria TdL carrega em si um peso ideológico muito forte? E que por sinal caiu com o muro em 1989?

Poulat, o catolicismo e as ciências humanas

Para quem se aventura na discussão sobre o catolicismo do século XX entre continuidades e descontinuidades (tenho pavor desse "entre... e...", mas tive que usar) veja esse belo texto de Danielle Menozzi comentando a obra de Émile Poulat: "L'Église et la modernité: une relation compliquée". In: ZUBER, Valentine (dir.). Un objet de science, le catholicisme. Lonrai: Bayard, 2001. Além do historiador, encontram-se outros textos de importantes estudiosos como Danièle Hervieu-Leger, Andrea Riccardi, Étienne Fouilloux, Clade Langlois e Dominique Julia. Os textos são frutos do encontro realizado na Sorbonne em 22 e 23 de outubro de 1999 com o nome de Réflexions autour de l'oeuvre d'Émile Poulat.

Óbulo de São Pedro

Os norte-americanos são os que mais colaboraram com a Santa Sé no Óbulo de São Pedro. O Brasil foi o maior doador na América Latina.
As nações que mais contribuiram (valor em US$)
Estados Unidos - 18 milhões 725 mil 327
Itália - 8 milhões 632 mil e 171
Alemanha - 4 milhões 26 mil 308
Espanha - 2 milhões 715 mil 527

Brasil (sétimo lugar em ordem mundial) - 1 milhão 441 mil 987

Fonte: www.aciprensa.com

Déficit na Santa Sé

De acordo com o La Croix, pela primeira vez depois da ascensão de Ratzinger ao trono pontifício, o balanço econômico do ano da Santa Sé teve déficit. 245,8 milhôes de euros foi o valor do buraco. Tais despesas totais estão divididas em quatro setores: atividades institucionais, financeiras, imobiliárias e midiáticas.

Nota da CNBB: rejeição Projeto de lei 1.135/91

Nota da CNBB sobre a rejeição do Projeto de Lei 1.135/91

A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados, em votação simbólica, rejeitou nesta quarta-feira, o projeto de lei 1135/91, que visava suprimir o artigo 124 do Código Penal que define o aborto provocado como crime.

Após longo debate, concluiu-se que tal projeto de lei é inconstitucional, e que o direito à vida, assegurado no artigo 5o da Constituição Federal, constitui um valor supremo, do qual decorrem todos os demais direitos. Assim, mais uma vez, foi respeitada a voz da grande maioria da população brasileira, que é decididamente contrária à prática do aborto e que defende a vida e a dignidade humana, desde a fecundação, até seu declino natural.

A Carta Encíclica Evangelium vitae, do Papa João Paulo II, sobre o valor e a inviolabilidade da vida humana, afirma que “o ser humano deve ser respeitado e tratado como uma pessoa desde a sua concepção e, por isso, desde esse mesmo momento, devem-lhe ser reconhecidos os direitos da pessoa, entre os quais e primeiro de todos, o direito inviolável de cada ser humano inocente à vida” (EV 60). Assim, matar um ser humano é sinal de desvalorização da vida, que precisa ser protegida em toda e qualquer circunstâncias, independentemente de há quanto tempo e de como está existindo.
A CNBB dirige uma palavra de incentivo e reconhecimento a todos os deputados e deputadas que votaram pela vida dos nascituros, bem como aos Movimentos em Defesa da Vida e a todos e todas que, de alguma forma se empenham firmemente na difícil tarefa de promover e defender a vida humana, compreendida como dom de Deus e co-responsabilidade de todos, da concepção até sua morte natural.

Brasília, 10 de julho de 2008

+Dom Dimas Lara Barbosa

Bispo Auxiliar do Rio de Janeiro

Secretário Geral da CNBB

Novos Ordo 2.0


Fonte: www.creativeminorityreport.com

Do Telegraph londrino: Missa antiga em todas as paróquias




A 'Missa Antiga' em todas as paróquias



No último domingo,15 de junho de 2008, na catedral Westminster de Londres, Sé Primaz da Inglaterra, o Cardeal Dario Castrillon Hoyos, declarou que o papa deseja introduzir o “Rito Gregoriano” em todas as paróquias da Igreja Ocidental.

O presidente da Pontifícia Comissão Ecclesia Dei fez importantes declarações acerca do futuro das paróquias católicas e a implementação do motu proprio Summorum Pontificum, costumeiramente congelado e anulado por conta das ações dos bispos.

Após a entrevista coletiva
transcrita abaixo - por Damian Thompson, do diário londrino The Telegraph, um dos quatro jornalistas presentes na coletiva - o Cardeal rezou a primeira Missa Solene Pontífícia na Catedral Londrina desde a reforma litúrgica, há quase 40 anos.

O Cardeal Murphy O’Connor – primaz da Inglaterra – não estava presente, apesar de enviar uma carta de boas-vindas, um tanto fria. Nenhum de seus bispos auxiliares compareceu.

O anúncio de que o Papa quer o retorno da missa tradicional em todas as paróquias, feito pelo Cardeal surpreende todos os católicos que acompanham com apreensão e cuidado todo o desenvolvimento da questão litúrgica que aflige a Igreja no pós-concílio.


Reuters: Em algumas partes do mundo parece existir resistência por parte dos bispos locais em permitir aos fiéis plena liberdade para celebrar a forma extraordinária. O que você recomenda a esses fiéis fazerem?

Cardeal Castrillon: A estarem informados. Muitas das dificuldades surgem porque eles não conhecem a realidade do Rito Gregoriano – esse é o nome correto da forma extraordinária, pois essa missa nunca foi proibida, nunca. Hoje para muitos bispos é difícil porque eles não têm padres que saibam latim. Muitos seminaristas dedicam muito poucas horas ao latim – insuficientes para dar a necessária preparação para celebrar de boa maneira a Forma Extraordinária. Outros pensam que o Papa está indo contra o Concílio Vaticano II. Isso é ignorância absoluta. Os padres do Concílio nunca celebraram a Missa de outra maneira que não a gregoriana. Ele [o novus ordo] veio depois do Concílio… O Santo Padre, que é um teólogo e que estava na preparação do Concílio, está atuando exatamente conforme o Concílio, dando liberdade aos diferentes tipos de celebração. Essa celebração, a Gregoriana, foi a celebração da Igreja durante mais de mil anos… Outros dizem que não podem celebrar com as costas para o povo. Isso é ridículo. O Filho de Deus sacrificou-se ao Pai com seu rosto voltado ao Pai. Não é contra o povo. É pelo povo…

Damian Thompson (Telegraph): Eminência, o Santo Padre gostaria de ver as paróquias comuns da Inglaterra que não tem conhecimento do Rito Gregoriano, apresentadas à ele?

Cardeal Castrillon: Sim, é claro. Nós não podemos celebrá-lo sem o conhecimento da língua, dos sinais, das jeitos do rito, e algumas instituições da Igreja estão ajudando nesse sentido.

DT: Então o Papa gostaria de ver muitas paróquias fornecendo o Rito Gregoriano?

Cardeal Castrillon: Não muitas – todas as paróquias, pois isso é um dom de Deus. Ele [o Rito] oferece essas riquezas e é muito importante para as novas gerações conhecer o passado da Igreja. Esse tipo de liturgia é tão nobre, tão bonito – a mais teológica das formas de expressar nossa fé. A liturgia, a música, a arquitetura, as pinturas, fazem um todo que é um tesouro. O Santo Padre está desejoso de oferecer a todas as pessoas essa possibilidade, não apenas para poucos grupos que pedem, mas para que todos conheçam essa forma de se celebrar a eucaristia na Igreja Católica.

Anna Arco (The Catholic Herald): Nesse sentido, gostaria de ver todos os seminários da Inglaterra e Gales ensinando os seminaristas a celebrar na forma extraordinária?

Cardeal Castrillon: Eu gostaria e será necessário. Nós estamos escrevendo aos seminários, estamos de acordo que devemos fazer uma grande preparação não apenas para o Rito, mas para ensinar a teologia, a filosofia, a língua latina….

DT: Quais seriam os passos práticos para as paróquias ordinárias [para se preparar para o Rito Gregoriano]?

Cardeal Castrillon: Se o pároco reserva uma hora aos domingos para celebrar a Missa e preparar com catequese a comunidade para compreendê-lo, apreciar o poder do silêncio, o poder da sagrada forma de frente para Deus, a profunda teologia, para descobrir como e por que o padre representa Cristo e rezar com o padre.

EC: Eminência, eu penso que muitos católicos estão mais que confusos por essa nova ênfase no Rito Tridentino, principalmente porque nós fomos ensinados que o Novo Rito representava um progresso verdadeiro, e muitos de nós que crescemos com ele o vemos como um progresso verdadeiro, que existam ministros da Eucaristia, mulheres no santuário, que somos todos sacerdotes, profetas e reis. Essa nova ênfase para muitos de nós parece negar isso.

Cardeal Castrillon: Que progresso? “Progredire” significa [oferecer] o melhor para Deus… Eu estou surpreso porque muitas pessoas jovens são entusiastas da celebração do Rito Gregoriano …

EC: No Motu Proprio, a ênfase do Papa é em um Rito e duas formas, e ele descreve o Rito Tridentino como “extraordinário”. Extraordinário portanto significa excepcional, algo que não celebramos todo domingo.

Cardeal Castrillon: Não “excepcional”. Extraordinário significa “não ordinário”, e não “excepcional”.

DT: Existirá um esclarecimento sobre o Motu Proprio?

Cardeal Castrillon: Não exatamente um esclarecimento do Motu Proprio, mas de matérias tratadas no Motu Proprio, tais como o calendário, ordenações ao sub-diaconato, a forma de usar os paramentos, o jejum eucarístico.

DT: E quanto ao “grupo estável”?

Cardeal Castrillon: Isso é uma matéria de senso comum… Em todo palácio episcopal existem talvez três ou quatro pessoas. Isso é um grupo estável…. Não é possível dar a duas pessoas uma missa, mas duas aqui, duas ali, duas acolá – eles podem tê-la. Eles são um grupo estável.

DT: De paróquias diferentes?

Cardeal Castrillon: Sem problema! Esse é o nosso mundo. Gerentes de empresas não vivem no mesmo lugar, mas eles são um grupo estável.

Taí! O Vaticano II e toda a conjuntura que adveio dele não pára de trazer à tona novos desenlaces. Aqueles que se viram como vencedores vão tomando conhecimento de tão efêmera vitória e vêem o papa como um retrógrado. E os que são os herdeiros do Coetus Internationalis Patrum, grupo encabeçado por Sigaud, Lefebvre e Castro Mayer, e que lutou contra as "aberturas litúrgicas" no concílio, além de outras coisas, acham que o papa também é um retrógrado, mas para aonde a Igreja nunca deveria ter saído.
O que o papa oferece não é "um presente" para os lefebvristas, nem um retrocesso ao pré-Vaticano II (conceito utilizado por mim apenas como marco cronológico), como querem os progressistas, mas uma possibilidade para que os cristãos conheçam sua história a partir de uma liturgia que foi ordinária por mil anos que é sim, riquíssima e bela. Tornar as costas para ela a partir simplesmente de um discurso que afirma que "aquilo" é velho e cacarento, além de negá-lo para afirmar o sincretismo, não covence e não convém. O rito gregoriano também é carregado de seus sincretismos. Agora, o epíteto usado por João XXIII para designar aqueles que viam na modernidade só erros, os "profetas da desgraça", poderá ser utilizado por outro grupo: o daqueles que vêem nas atitudes de Bento XVI um retrocesso que levará a Igreja às ruínas. Ótimo momento para discutirmos as hermenêuticas da continuidade e da descontinuidade.